Virtualização do trabalho, produtividade e saúde do servidor (parte 2)
segunda-feira, 08/08/16 17:00
A virtualização do trabalho aumenta o controle da jornada, via controle do ponto eletrônico. Acabou a facilitação, a flexibilização. Qualquer deslize no horário gera anomalias e justificativas, ou seja, mais controle e mais burocracia. Mas o trabalho virtual tem sua marca: o PJe, primeira grande mudança de paradigma referente ao processo judicial, que deixa de ser físico para ser virtual. Entretanto, a forma como o PJe foi implementado gerou várias críticas relatadas ao Núcleo de Saúde do Sinjus e apuradas também pela última enquete veiculada pelo Sindicato. Alguns exemplos: pouco tempo de treinamento para os servidores, nem todos os servidores participam do treinamento, falta simulação para melhorar o aprendizado, ergonomia e espaço físico dos monitores, sistema operacional com muitas falhas e que não interagem com outros sistemas do próprio tribunal, entre outras.
Pior ainda, jovens com pouco mais de dois anos de Pje já apresentam sintomas de LER, pois não são feitas as pausas e o corpo não é máquina para repetir movimentos infinitamente. Por isso, a importância de pausas, de uma ginástica laboral, de se levantar da cadeira e sair da frente do computador, mas como fazer isto se não há uma norma que oriente o servidor a cuidar de sua saúde. A lei que impera no tribunal é a da produtividade, com chefias controlando até idas ao banheiro ou para pegar água. Como então o servidor vai cuidar de sua saúde com as pausas necessárias se o chefe “bufa de raiva” por qualquer coisa? Aliás, o nível de estresse das chefias é altíssimo, pois estas chefias são cobradas pelo superior e pelas metas introjetadas como obrigação, sem questionar a viabilidade de serem executadas no tempo determinado, pois não há diálogo, em uma cultura de autoritarismo e de uma hierarquia vertical. O que vale é o imperativo. CUMPRA-SE!
Alguns tribunais estão experimentando um software, que avisa da necessidade das pausas, com um alarme no próprio computador, mas se não for regulamentado via portaria, no meu entendimento, não surtirá efeito, pela pressão de produtividade e cumprimento de metas que é exigido, esquecendo que o excesso de trabalho adoece, e a produtividade cai quando alguém esta em sofrimento no trabalho ou se ausenta do trabalho por adoecer.
O coletivo do trabalho sempre acha soluções, como um grupo que percebeu que mais de 3 horas em frente às telas do PJe eram improdutivas pois o cérebro não assimila informações, portanto, o grupo fazia rodízio entre quem ficava com os processos físicos e eletrônicos e, como a produtividade aumentou, a chefia concordou. Mas como fazer para que pequenas atitudes como esta sejam respaldadas por outras chefias? Somente com a normatizaçao de medidas preventivas, como explicou o médico do trabalho Rogério Dornelles durante o Consinjus. São elas: pausas, tanto na digitação, quanto no olhar fixo em frente ao computador, que causa secura nos olhos, irritação, desfoque e embaralhamento das letras na tela do computador; levantar da cadeira para melhorar a circulação sanguínea, ou seja, atitudes simples, mas que devem ser respeitadas pelas chefias e cumpridas pelos servidores.
Com relação ao irmão mais novo do projeto de virtualização do trabalho, o teletrabalho pode ser uma boa ideia, mas mais uma vez o sindicato alerta: A Portaria Conjunta 493/PR/2016 que institui o teletrabalho no TJMG é bem superficial frente à resolução 227/2016 do CNJ que regulamenta o teletrabalho no âmbito da administração Pública Judiciária. Entretanto a própria resolução do CNJ abre brechas para que os Tribunais regulamentem o teletrabalho “conforme peculiaridades de cada região”. Mas se você, servidor do TJMG, tiver curiosidade leia o artigo 7 e 9 da resolução 227/2016 do CNJ e principalmente o artigo 13. Está claro, o servidor vai ter que arcar com os custos do computador, montar um escritório em casa, pagar internet, telefone, suprimentos, cumprir meta de desempenho maior entre tantas obrigações. Ou seja, mais controle sobre o serviço e a produção, via informática. Mais uma vez o capital conseguiu uma forma de diminuir os custos, se antes a empresa ou instituição oferecia o mínimo de condições de trabalho, o escritório, agora é você trabalhador que vai tirar este custo da empresa/instituição. O artigo 10 da resolução 227/2016 do CNJ que trata das punições é bem severo: “…temporária ou definitiva suspensão do regime de teletrabalho… …abertura de procedimento administrativo disciplinar para apuração de responsabilidade…”
Para Alan da Costa Macedo, servidor do judiciário federal, professor e sindicalista, “…o artigo supra regulamenta a negatória ao contraditório, a ampla defesa e garante a presunção de culpa em detrimento da presunção da inocência…mesmo tendo o servidor prestado os devidos esclarecimentos, haverá imediata suspensão do trabalho remoto e imediata abertura do procedimento administrativo disciplinar, sem sindicância prévia”. Note-se que esta é a regulamentação do CNJ, por isso temos que entender o contrato de adesão ao teletrabalho do TJMG, em suas “letras miúdas”.
Mas, a grande mudança de paradigma no entanto, é que o teletrabalho já está fazendo uma revolução no mundo do trabalho, pois mudamos o conceito e prática do trabalho por jornada no local de trabalho, para o conceito de trabalho por produção, distante do local de trabalho. Isto vai ser prejudicial ao trabalhador, pois para ter o direito ao teletrabalho, o trabalhador terá que produzir mais 20% que o trabalhador que optou pela jornada no TJMG. Veja bem, se você esta trabalhando e o sistema de informática “cai” você não pode fazer nada, tem que aguardar, mas quando chegar seu horário de encerrar o expediente você vai embora, No caso do teletrabalho, se você agendou trabalhar à tarde e o sistema cair, você terá que fazer o trabalho à noite ou no fim de semana. Com relação à produtividade, a fórmula de produtividade, contida na resolução 219/2016 do CNJ, não tem um fator matemático, que faça uma indexação das dificuldades do trabalho, pois existem processos mais simples e mais complicados, por exemplo, Uber x taxistas, onde todos os 7500 taxistas tinham que ser cadastrados. Então um processo mais trabalhoso vai ter o mesmo peso de um mais simples? Eis a contradição da fórmula de produtividade. Um diretor do Sinjus me contou que foi visitar parentes que trabalham na justiça federal onde o teletrabalho já existe, mas os amigos não puderam lhe receber no fim de semana pois estavam com trabalho do serviço acumulado em casa. Por fim, a ultima crítica ao teletrabalho: a invasão do espaço privado e afetivo do lar pelo trabalho.
O Núcleo de Saúde do Sinjus esta produzindo um dossiê dos debates sobre Saúde e Humanização das relações de trabalho: virtualização, home office e as doenças laborais com as propostas dos servidores aprovadas no Consinjus, para debater este tema no TJMG e no TJMMG. O Sinjus também tem solicitado a formação do comitê gestor de saúde integral de servidores e magistrados, conforme resolução 207/2015 do CNJ com a participação do sindicato para debater este e outros temas referentes ao trabalho e à saúde do trabalhador. O TJMMG acaba de formar seu comitê gestor e o Sinjus já solicitou a participação nas reuniões deste comitê. Esperamos que com a nova presidência do TJMG o comitê gestor seja logo implementado para que a saúde o servidor e do magistrado seja uma pauta de ação em prol da saúde de todos nós trabalhadores.
*Arthur lobato
Psicólogo/Saúde do Trabalhador