Desmonte

Reforma Administrativa: como a PEC 32 afetará você

terça-feira, 18/10/22 15:46

Foto: Agência Brasil

Não é novidade que o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL),  quer acelerar a votação da Reforma Administrativa após as Eleições. Mais do que nunca, é momento de intensificar a luta e divulgar informações corretas para conscientizar a população sobre os riscos da PEC 32.

Confira abaixo uma análise sobre as premissas que levaram o Governo a propor esse projeto e a veracidade das alegações confrontadas com documentos oficiais – muitos elaborados pelo próprio Governo ou seus órgãos de consulta.

O Brasil tem um número alto de servidores públicos?
Não. A proporção de empregos públicos em relação à força total de trabalho no Brasil é relativamente baixa em comparação com países desenvolvidos. O Brasil tem cerca de 12% de sua força de trabalho no poder público. A média dos 32 países pesquisados pela OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico) é de 21% sobre o total de trabalhadores. Assim, na verdade, faltam servidores em diversas áreas, como na saúde, no INSS e na fiscalização.

Os servidores públicos são privilegiados e ganham muito?
De acordo com o censo feito pelo Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (IPEA), ou seja, do próprio governo, em 2018 a média salarial de servidores municipais é de R$ 2.150,00, dos Estaduais é de R$ 4.150,00 e dos Federais, R$ 6.500,00. Assim, a afirmação de que os servidores públicos são privilegiados e ganham muito é inverídica.

A reforma vai acabar com os altos salários e privilégios?
Não. Primeiro, como vimos, a maioria dos servidores não têm salários altos. Segundo, os privilegiados estão fora da reforma Administrativa, como parlamentares, membros de poder e militares das forças armadas. Desse modo, serão prejudicados apenas os servidores que ganham menos e estão à frente do atendimento à população: nos postos de saúde, nas escolas, na assistência social.

O servidor nunca pode ser demitido?
Outra premissa falsa. O servidor pode ser demitido e perder o cargo; dessa forma a estabilidade não é absoluta. Existem hipóteses de perda de cargo pelo servidor estável já estabelecidas em lei e pela própria Constituição Federal, sendo elas:

Decisão transitada em julgado ou de órgão judicial colegiado;
Processo administrativo com ampla defesa;
Processo de perda de cargo após avaliação de desempenho; e
Excesso de despesas de pessoal (art. 169, §§ 3º a 7º, CF);

A PEC representa economia dos cofres públicos?
Não, pelo contrário. Segundo a Nota Técnica da Consultoria de Orçamentos, Fiscalização e Controle do Senado Federal, a proposta, “de forma agregada, deverá piorar a situação fiscal da União, seja por aumento das despesas ou por redução das receitas”. A PEC foi elaborada sem qualquer avaliação de impacto orçamentário-financeiro. O TCU (Tribunal de Contas da União) cobrou do governo federal a divulgação dos estudos e da metodologia de cálculo que fundamentaram as projeções de impacto fiscal da reforma administrativa.

Em resposta, porém, o Ministério da Economia reconheceu, em Nota Técnica, que não há como calcular o impacto financeiro. Ou seja, a PEC representa, na verdade, uma aventura jurídica cujos efeitos financeiros sobre o serviço público só poderão ser calculados depois que acontecerem, o que é por demais temerário e sem qualquer razoabilidade. Resumindo, o próprio governo não consegue calcular ou prever o impacto da PEC, agindo com total falta de responsabilidade.

Quais os efeitos para a sociedade?
O fim da estabilidade para o servidor público não permitirá que ele exerça sua função com autonomia, como a de denunciar se souber de desvios, corrupção ou outras improbidades, podendo ser perseguido por agentes políticos. A estabilidade, na verdade, protege os servidores de pressões políticas no exercício de sua atividade e resguarda-o de demissões arbitrárias por interesse político. Servidores sem estabilidade são muito mais suscetíveis a pressões políticas e podem ser cooptados por gestores mal-intencionados.

A reforma vai contribuir para o aumento da corrupção?
Segundo o consultor legislativo Vinícius Leopoldino do Amaral, que assina a Nota Técnica da Consultoria de Orçamento, Fiscalização e Controle do Senado Federal, a proposta apresenta efeitos como “aumento da corrupção, facilitação da captura do Estado por agentes privados e redução da eficiência do setor público em virtude da desestruturação das organizações”.

Precarização dos serviços públicos
O texto propõe a admissão ampla de temporários (contratação por prazo determinado). Substituir servidores concursados por temporários – muitas vezes apadrinhados – pode desviar a finalidade do interesse público e causar a precarização do serviço. Essa reforma significa, com certeza, o sucateamento e retrocessos para o setor público e a sociedade em geral, que terá um serviço público de menor qualidade.

Os cidadãos, usuários do serviço público, serão os maiores atingidos por essa precarização, pois dependem de escolas para seus filhos, serviços de saúde pública como postos de saúde, hospitais públicos, vigilância epidemiológica, órgãos de fiscalização que não permitem desvios dos cofres públicos que causam maiores prejuízos ainda aos serviços prestados, enfim, quem recebe o serviço público ou seus efeitos certamente será vítima dessa aventura irresponsável da propositura dessa PEC, como pudemos verificar.

Como o servidor público ativo e aposentado serão afetados pela PEC 32?
Estudos sobre o funcionalismo público apontam que nos próximos 10 anos, algo como 60%/70% dos servidores estarão aposentados. Caso a reforma administrativa vingue, com a ampliação do contrato temporário, a cara do funcionalismo será de servidores não estáveis.

Essa reforma administrativa levará á quebra dos Fundos que pagam aposentadorias e pensões dos servidores. A proposta prevê que os novos servidores contribuirão ao Regime Geral de Previdência Social (RGPS) e não ao RPPS. Com isso, as contribuições desses novos servidores deixarão de abastecer o regime dos atuais aposentados e serão encaminhadas ao INSS, o que vai gerar um colapso no RPPS, com sucessivos cortes de valores que pagam aposentadorias e pensões, até o fim total do regime. Ao priorizar e generalizar o contrato precário, a tendência é que se tenha situações, em alguns órgãos, em que praticamente todos os servidores serão por contrato temporário, o que afeta o financiamento do RPPS, como vimos.

O substitutivo não permite mais enquadrar no RGPS o ocupante de cargo que não seja exclusivo de Estado. Outra limitação drástica de arrecadação para o Fundo que paga as aposentadorias e pensões dos servidores.

Além disso, a PEC 32 acaba com a Paridade, em que os aposentados e pensionistas recebem automaticamente o reajuste concedido aos servidores da ativa. Os aposentados não terão qualquer previsão de reajustes. O atual e o futuro aposentado só tem a Paridade porque a sua carreira existe na ativa e serve de referência para a paridade. Se essa carreira da ativa desaparece, a paridade também perde o sentido. O Parecer substitutivo prevê a permissão do desligamento de servidores de cargos considerados obsoletos, com exceção apenas dos enquadrados como Cargos Típicos de Estado. Extinto o cargo, a paridade perde a sua referência.

Ativos: Jornada e Remuneração 
Pelo substitutivo a redução de jornada de trabalho e da remuneração de servidores ficou limitada a 25% e somente poderá ocorrer em períodos de crise fiscal.

Ativos: Adicionais temporais, progressão e parcelas indenizatórias
Será vedada a concessão de qualquer adicional referente a tempo de serviço como anuênios, quinquênios, sexta-parte, licenças-prêmio, licença-assiduidade ou outra licença decorrente de tempo de serviço, bem como progressão ou promoção baseada em tempo de serviço e qualquer adicional ou indenização por substituição.

Ativos: Contratos temporários 
O relatório substitutivo, do relator Arthur Maia, alarga o contrato temporário para todas as áreas públicas que não forem as de função típicas de Estado. Ao permitir o uso demasiado desse conceito, ocorre, de forma fraudulenta, a quebra da estabilidade dos servidores. E, mantida a “possibilidade de realização de instrumentos de cooperação entre o governo federal, estadual ou distrital com entidades privadas para gestão dos equipamentos públicos, como escolas e hospitais”, como está nesse relatório, os serviços a serem prestados por quem não tem estabilidade, não passou por concurso público, com políticos indicando quem deve ser contratado, certamente não corresponderá a um mínimo de qualidade aceitável de serviços a serem prestados à sociedade.

Mário Medeiros Neto é vice-presidente da Associação Federal dos Oficiais de Justiça do Brasil e Secretário Geral da Associação dos Oficiais de Justiça do Estado de São Paulo.

Fonte: SINJUS-MG com informações da Aojesp

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