Lado Chinês e Lado Brasil

sexta-feira, 06/06/14 12:00
 
O Presidente Xi Jinping já não dorme as mesmas noites de sono.
 
Após 40 anos com crescimento anual de 10% ao ano, com âncoras no desenfreado consumo americano, a realidade já não é mais a mesma.
 
O povo saiu às ruas em protesto: melhores serviços de saúde e educação, previdência, condições de vida urbana digna para uma população de migrantes rurais que não para de crescer. 47% dos chineses vivem na zona rural e aspiram por melhor qualidade de vida.
Nos últimos 10 anos os chineses pouparam 46% do PIB, o que não tem sido suficiente para atender a uma população de 1,3 bilhão de habitantes. Daí os protestos de rua, na terra de Mao.
 
Xi Jinping abriu seu plano de reformas. Não se trata mais de crescer a 10% ao ano. Trata-se, se quiser se manter no poder e continuar legitimando o Partido, de prover a população, sobretudo a nova classe média, com serviços de qualidade, aí incluída a qualidade de vida ambiental. Segundo a OMS, apenas 1% das grandes cidades chinesas se adequa aos padrões de  qualidade do ar. 
 
No lado Brasil, ao contrário, o povo vive uma cadeia de frustrações.
 
Sem plano de reformas que volte a colocar o país nos trilhos, um PIB cada vez mais medíocre (0,2% no último trimestre), inflação no teto da meta, deterioração das contas externas, ausência de investimentos, condições precárias de saúde, de educação, de segurança e de mobilidade urbana,  sobretudo para os menos favorecidos. Não é de hoje a desarrumação macroeconômica: política fiscal frouxa, antecipação da derrubada dos juros, expansão do crédito fácil, desvalorização da moeda, represamento de tarifas públicas, todos ingredientes de um modelo de desenvolvimento baseado no consumo das famílias, que agora não mais se sustenta.
 
E o povo, assustado, descobre que poupar é preciso.
Por diversas razões. Entre elas, pagar as dívidas às quais foi estimulado a contrair; manter-se minimamente a salvo, quando vierem ( e eles terão que vir em 2015) os ajustes na economia e a transferência para a sociedade das contas até aqui inescrupulosamente represadas (vide Petrobrás e Eletrobrás).
 
Não menos importante, poupar para a velhice, em ambiente de um sistema previdenciário falido, ou pior, cuja falência, a médio prazo, ainda não preocupa as autoridades. Uma população economicamente ativa cada vez menor a ter que sustentar inativos e idosos em número cada vez maior, também fruto de políticas assumidas no passado e insustentáveis no futuro.
 
Em 1970, tínhamos 4,2 contribuintes para cada beneficiário da previdência; hoje, temos 1,9 e prevê-se para 2020 apenas 1,2.
Uma reforma que, ao chegar, doerá mais no bolso do brasileiro.
Aí sim, valerá a lição dos chineses. 
Poupar é preciso.
Além de sair para as ruas e engrossar os protestos do povo.
 

José Moreira Magalhães

É economista, com especialização em Planejamento Governamental; consultor em orçamento e finanças; e fiscal de tributos estaduais. Foi diretor de arrecadação, diretor do Tesouro Estadual e Diretor Financeiro do TJMG. Autor do livro "Desvendando as Finanças Públicas".

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