Virtualização do trabalho, produtividade e saúde do servidor

sexta-feira, 29/07/16 18:20
Arthur Lobato*
 
O sistema capitalista, através do projeto neoliberal, tem como essência maximizar os lucros e minimizar os custos. Já foi provado que maior parte dos lucros vem da exploração dos trabalhadores que recebem baixos salários, são explorados em sua força de trabalho, além de não receberem por horas extras e outros direitos. Com o desemprego estrutural, enquanto componente essencial da exploração do homem pelo homem, as empresas exigem um funcionário capacitado, dócil, flexível e envolvido com o trabalho, de forma a resolver problemas que são da empresa mas que passam a ser dele trabalhador, é a chamada captura da subjetividade. Assim, nada melhor para as empresas na busca de diminuição de custos, do que “terceirizar”, e não somente na contratação de empregados que vão trabalhar à distancia da empresa/instituição, mas também, terceirização para o trabalhador do que seria obrigação da empresa/instituição para que o trabalho burocrático seja executado: mesa, cadeira, computador, telefone, internet, ou seja, “monte você mesmo seu escritório” (por conta própria), e além disto, produza 20% a mais do que seus colegas que estão na empresa/instituição. Ah sim, pelo mesmo salário!!!!
 
Enfim, o capital conseguiu mais uma forma de diminuir os custos e aumentar a produtividade, sem aumentar salários: se antes a empresa/instituição oferecia o mínimo de condições de trabalho, ou seja, o escritório, agora é você trabalhador que vai arcar com este custo. Parece até o contrato do leão com o cordeiro como diziam as fábulas de cunho social.
 
Diante deste panorama tenebroso, onde o projeto de terceirização da atividade fim vai criar mais precarização do trabalho e desregulamentação das leis trabalhistas, o concurso público parece um oásis no meio do deserto. Estabilidade, bons salários, um serviço burocrático “tranquilo”, sem viagens, jornada de 6 horas, progressões e promoções na carreira. Parece o paraíso do mundo do trabalho. Mas, quem trabalha no TJMG sabe que não é bem assim e que o trabalho também adoece, conforme os dados dos estudos de absenteísmo da instituição. Causa preocupação que a maior parte dos afastamentos sejam por transtornos mentais, seguida pelas doenças osteomusculares. Sobre este afastamento (Ler Dort) os constantes movimentos repetitivos do trabalhador, o mobiliário inadequado, cadeiras velhas, mesas pequenas para tantos processos, os movimentos bruscos  para abaixar e pegar processos  no chão ou processos físicos que estão no alto de prateleiras, o peso dos mesmos, ausência de pausas no trabalho tudo isto contribui para que ao longo do tempo as dores na coluna, ombro e demais articulações do corpo sofram desgaste. Podemos considerar a Ler Dort (lesão por esforço repetitivo e doenças osteomusculares) doenças laborais, ou seja, aquelas desenvolvidas por causa da atividade do trabalho no dia a dia. Mas, e os transtornos mentais?
 
Várias hipóteses podem ser aventadas, mas a maioria dos transtornos  mentais e emocionais pode ter uma série de componentes, como a frustração de um serviço monótono, burocrático, o desconhecimento da função e sua inadaptação a esta função após ser aprovado em  um concurso difícil e que exige formação em direito, mas que vai ter que lidar com informática e trabalhar oito horas em vez de seis, como aconteceu no último concurso do TJMG. Uma das causas principais de afastamento por transtornos mentais e emocionais é o conflito interpessoal, ou seja, conflito principalmente com as chefias rígidas, controladoras, que negam o diálogo,  que abusam do poder e do autoritarismo. Outra causa de transtornos podem ter origem em  conflitos com  os colegas. Enfim, o que adoece é a desarmonia entre o que eu sou, o que quero ser e como estou vivendo.
 
Afinal, o que tenho que suportar para sobreviver? Quais são os limites? E quando aumenta    percepção da injustiça, a impotência de reagir por um lado e por outro, a revolta frente à injustiça  “enfiada goela adentro”, a emoção  sufocada, represada até o tênue dique chamado “normalidade” romper frente a constante desvalorização enquanto profissional, enquanto ser humano. A palavra fere, maltrata, magoa, adoece.
 
Os transtornos mentais e emocionais são um conjunto de sintomas  (choro, insônia, ideia fixa…) deste silencioso adoecer. Desequilíbrio emocional causado pela mágoa, pela impotência de reagir. Conviver  com o tratamento diferenciado onde uns podem tudo e outros não têm direitos só deveres, onde tudo depende do bom humor (raro) da chefia. O que dizer do sentimento de injustiça ante uma avaliação de desempenho usada como forma de exercer poder. Perceber-se sozinho frente a apatia dos colegas, pois o individualismo, que é outra característica do trabalho no mundo globalizado, rompe os laços de solidariedade, já dizia o filósofo Jean Paul Sartre: “o inferno são os outros."
 
Neste contexto surge uma esperança, a luz no fim do túnel o tele trabalho, ou home office ou trabalho à distancia. Esta modalidade de trabalho, que vem sendo debatida pelo Sinjus em rodas de conversa, debates internos da diretoria, palestras, grupo de trabalho, culminou com um documento construído, debatido e aprovado na plenária do Consinjus/2016.
 
Fim da primeira parte. Este tema continua no próximo artigo.
 
 
*Arthur lobato
Psicólogo/Saúde do Trabalhador

Arthur Lobato

É psicólogo da área de saúde do trabalhador. Integra a equipe da Comissão de Assédio Moral do SINJUS-MG. Participou de Congressos Internacionais sobre o tema no Brasil, Argentina e México. Sócio colaborador da Associação Nacional de Medicina do Trabalho (ANAMT).

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