Análise do documento Uma ponte para o futuro – Parte II

quinta-feira, 12/05/16 12:00

 

*por Thiago Rodarte

Neste artigo daremos continuidade à análise do documento do PMDB – Partido do Movimento Democrático Brasileiro – “Uma ponte para o futuro[1]”, sendo que agora abordaremos os aspectos relacionados às políticas apontadas pelo texto como indispensáveis para a retomada do crescimento econômico. (A primeira análise você confere aqui).
 
Dentre estas medidas uma que chama a atenção e tem implicações diretas sobre a vida da classe trabalhadora, é permitir que prevaleçam, na área trabalhista, as convenções coletivas sobre o que está legislado, exceto nos direitos básicos. O argumento para defender esse tipo de proposta está, entre outros, na ideia de que a legislação trabalhista é ultrapassada e não corresponde a muitos anseios dos trabalhadores. Argumenta-se, por exemplo, que muitos gostariam de não ter a obrigatoriedade de ter o horário de almoço de uma hora. Isso certamente é verdade, apesar de não o ser para todos. O certo é que, garantir que o negociado prevaleça sobre o legislado (mesmo que haja exceções) abre espaço para a ampliação da exploração da mão de obra em níveis ainda maiores que os atuais.
 
Nosso mercado de trabalho é caracterizado por uma taxa de desemprego natural[2] muito elevada e por um grande número de trabalhadores alocados no setor informal, sem qualquer tipo de direito, ou seja, em nosso mercado de trabalho há o chamado “exército de reserva”. Com essas características, “flexibilizar” as leis trabalhistas, permitindo que o negociado prevaleça sobre o legislado, implica necessariamente em diminuir o poder de barganha da classe trabalhadora no momento da negociação. Isso pode levar os trabalhadores a ter de abrir mão de direitos conquistados, como férias, 13º, licença maternidade, entre outros, simplesmente para manter o emprego, até mesmo com menor remuneração.

Outra medida proposta é executar uma política de desenvolvimento centrada na iniciativa privada, por meio de transferências de ativos que se fizerem necessárias. Em linguagem simples isso significa privatizar, entregar para o setor privado os últimos patrimônios do estado brasileiro (entre eles Petrobrás, Banco do Brasil e CEF). A grande questão que se coloca nesse ponto é a possível venda da Petrobrás, ou então a diminuição de seu papel nos campos da área do Pré-Sal. Como se sabe, parte dos royalties oriundos da exploração desses campos de petróleo irá obrigatoriamente para a educação e saúde, o que significa a garantia de um fluxo de recursos muito grande para aquelas áreas. Desobrigar a Petrobrás de participar da exploração desses campos ou então privatiza-la poderá implicar em abrir mão de garantir esses investimentos em saúde e educação. Outra decorrência importante seria o fim da chamada política de conteúdo nacional: a partir do momento em que a Petrobrás é privatizada, isso significa que os insumos que ela adquire no país, produzidos por empresas brasileiras e por trabalhadores brasileiros passam a ser adquiridos no exterior. Na prática trata-se de eliminação de empresas e postos de trabalho no Brasil e consequente queda de arrecadação de tributos.

Outras medidas previstas pelo documento são construir uma trajetória de equilíbrio fiscal duradouro, com superávit operacional e a redução progressiva do endividamento público além de estabelecer um limite para as despesas de custeio inferior ao crescimento do PIB, através de lei, após serem eliminadas as vinculações e as indexações que engessam o orçamento.
 
No artigo anterior abordamos a questão fiscal, em especial a tributária. Vale voltar ao assunto para ressaltar o significado do termo superávit operacional e suas implicações. Já há alguns, anos o governo federal tem como meta obter superávit no conceito primário, que nada mais é do que arrecadar mais do que se gasta, com exceção dos gastos com os juros da dívida pública. Como se sabe, nem esse superávit tem sido alcançado. A definição de superávit operacional, por sua vez leva em conta as despesas com os juros, ou seja, será preciso que a arrecadação seja superior aos gastos primários mais os gastos com os juros da dívida. No conceito primário, o governo fechou 2015 com as despesas acima das receitas em cerca de R$ 111 bilhões. O pagamento de juros da dívida ficou em cerca de R$ 501 bilhões. Isso significa que em 2015 o país apresentou déficit nominal de cerca de R$ 612 bilhões. Ou seja, mantidos esses valores, para atingir a meta de obter superávit nominal o país teria de, ou arrecadar cerca de R$ 612 bilhões a mais, ou cortar despesas nesse montante ou qualquer combinação de aumento de arrecadação e corte de despesas que atinja o superávit. Para isso uma das propostas é eliminar as vinculações constitucionais com gastos em saúde e educação como vimos no artigo anterior.
 
Por fim outra medida que chama a atenção, e parece estar diretamente ligada à ideia de retomada das privatizações, é aumentar a abertura comercial e buscar acordos regionais de comércio com Estados Unidos, União Europeia e Ásia, com ou sem a companhia do Mercosul, embora preferencialmente com eles.
 
Com relação à ampliação da abertura comercial vale ressaltar que as trocas podem ser capazes de aumentar o bem-estar da sociedade, pois agregam à curva de oferta diversos bens e serviços que não são produzidos no país. No entanto, o perigo de abrir demais a economia para bens e serviços vindos do exterior, sem anteriormente formular e implantar uma política industrial que ajude a cambaleante indústria nacional a competir com seus concorrentes externos é aprofundar ainda mais a divisão internacional do trabalho hoje predominante, onde participamos como produtores de commodities e importadores de bens industriais de alto valor agregado. Isso significa gerar melhores empregos, com melhores salários no exterior e gerar empregos ainda mais precários por aqui.

 

Concluindo, nota-se que o diagnóstico é de que é necessário reduzir o tamanho do estado. Essa redução se dará por meio de privatizações e de cortes de gastos em áreas como saúde e educação. Dessa forma, a política a ser implantada não tem como ênfase uma estratégia de desenvolvimento nacional, autônoma; trata-se de uma estratégia que não privilegia a inclusão social e a melhora da qualidade de vida da população. Para ser assim precisaria ter como metas maiores investimentos em áreas como saúde, educação e qualificação da mão de obra para, com isso, além de alcançar crescimento econômico puro e simples, também obter melhoria nas questões ligadas à área social.


[1] Vale ressaltar que, de acordo com alguns pemedebistas, este documento não é a visão oficial do partido, pois não teria sido votado por seus membros.
 
[2] A taxa de desemprego natural é a taxa de desemprego para a qual a economia tende no longo prazo. Vulgarmente, pode ser entendida como uma média da taxa de desemprego em um longo período.
 
 


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Thiago Rodarte

É economista com graduação e mestrado pela UFMG, onde foi professor substituto. Ex-diretor da Secretaria de Desenvolvimento de Minas Gerais. Atua no DIEESE, assessorando, atualmente, os sindicatos dos servidores da Justiça Estadual de Minas Gerais.

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