A doença holandesa, o petróleo e a democracia

quinta-feira, 08/01/15 17:00

*por José Moreira Magalhães

A correlação se deve a Michael Ross, cientista político, professor da Universidade da Califórnia, em seu recente livro, ainda sem tradução no Brasil "The Oil Curse" – A Maldição do Petróleo.

Faz interessante referência à chamada "doença holandesa", fenômeno que ocorreu nos anos 60 nas economias dos países baixos, com a escalada dos preços do gás.

O fenômeno foi estudado pelos economistas Max Corden e Peter Neary, em 1982 e se aplica, genericamente, a situações em que, verificada a alta exorbitante do preço de um produto, muito comumente um produto de exportação, natural e não renovável, como petróleo, gás, minério, etc, chamados de commodities, a economia do país produtor passa por um período de exuberância, se especializa na produção daquele produto, aufere receitas substanciais de exportação e se esquece de estruturar sua economia para o longo prazo, para as épocas de vacas magras.

O período de euforia, muito frequentemente, convive com o de desindustrialização dos demais setores da economia, de forma direta, pela corrida da mão de obra especializada para o setor em expansão e, de forma indireta, pelo efeito do aumento de sua renda, o qual provoca um aumento anormal da demanda por todos os outros produtos, a elevação de seus preços e a corrida para as importações, substituindo a produção nacional e levando a economia a desindustrializar-se.

Em geral, ganham muito com o fenômeno os trabalhadores que se transferem para o setor, pelo aumento de renda, os proprietários dos recursos e, sobretudo, o Estado, que, na maioria das vezes estatiza a produção, caso típico do petróleo.

Michael Ross observa algumas correlações importantes com o mundo político, sobretudo no caso do petróleo, em situações de escalada dos preços e/ou de descobertas de reservas fantásticas.

A partir de 1999, assistimos à escalada dos preços, até US$ 140/barril e a ampliação das reservas medidas em vários países do mundo, inclusive no Brasil do pré-sal. Não raro, e aí está uma das suas principais correlações, essa fase de euforia coincide com movimentos antidemocráticos em todo o mundo ou com o fortalecimento de ditaduras já instaladas.

Isso porque, as elevadas riquezas do petróleo, concentradas nas mãos dos Estados tendem a gerar um desequilíbrio de poder em relação à sociedade em geral, diferentemente do que ocorre em economias diversificadas. O Estado tem recursos em abundância, o que permite o domínio sobretudo dos menos favorecidos, com medidas de caráter populista, o sufocamento das oposições, a não transparência e a corrupção.

Ross estudou 170 países em 50 anos de história e demonstra suas teses com exemplos como a Venezuela de Chávez, o Irã dos aiatolás, a Rússia de Putin, o Barein, o Iraque e a Líbia.

Outra forte correlação se dá entre as receitas do petróleo e a militarização dos países, outro fator de reforço de suas ditaduras.

O pior, quando os preços despencam, como agora, o caos se instala, porque a economia não tem produto substituto e a sociedade civil não se preparou para outras alternativas de poder, casos típicos da Venezuela de Maduro e da Rússia de Putin.

O intervencionismo estatal no Brasil, sua desindustrialização crescente, o sangramento da Petrobrás, a corrupção aberta em todos os nossos órgãos públicos, o baixo crescimento, a dependência da exportação de commodities, seriam eles fenômenos ligados às teses de Michael Ross?

 

José Moreira Magalhães

É economista, com especialização em Planejamento Governamental; consultor em orçamento e finanças; e fiscal de tributos estaduais. Foi diretor de arrecadação, diretor do Tesouro Estadual e Diretor Financeiro do TJMG. Autor do livro "Desvendando as Finanças Públicas".

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